terça-feira, 1 de maio de 2012

Entrevista com Dalmo Medeiros

Olá galera antenada!

O Connect@som começa mandando muito bem: entrevistamos Dalmo Medeiros.

Dalmo é um renomado músico, intérprete; componente do grupo MPB4. Teve várias de suas músicas gravadas por grandes artistas da música brasileira, como Ivete Sangalo e Elba Ramalho.
Compositor de mão cheia, tem experiência de sobra. Ele também é professor do Conservatório Brasileiro de Música, ministrando o curso de Produção Musical em Quatro Temas.


Equipe Connect@som
Dalmo, como você começou na música?

Dalmo Medeiros: Eu iniciei minha formação musical através do canto coral. Tendo um pai maestro, um dos fundadores da Orquestra Tabajara, e um tio cantor famoso, Cauby Peixoto, as influências eram inevitáveis. Aos 15 anos, o tio Cauby me presenteou (com) um violão e eu, de forma auto didata, aprendi os primeiros acordes e já cantava um pouco. Entrei para o coral da Universidade Gama Filho e depois para o coro da Pro-Arte, onde nasceu o Céu da Bôca, um grupo vocal que foi a minha escola.

Quais são as suas influências?
  
Dalmo: Inicialmente, minhas influências foram Beatles e a Bossa Nova. Com o aprendizado de harmonia no violão, essas influências se diversificaram com Milton Nascimento, Beto Guedes, Tom Jobim, Djavan, enfim, o que há de melhor na música brasileira. 

Conte um pouco sobre sua experiência no MPB4.

Dalmo: Me orgulho muito de estar há 8 anos no MPB4, um grupo que tem sua história confundida com a própria história da música brasileira. Com eles eu estou sempre aprendendo, seja nos ensaios ou nos palcos. Os arranjos vocais do Magro são maravilhosos, alguns deles históricos, como os arranjos de Roda Viva, O Cálice, Pesadelo, Última forma, entre muitos outros.  

Direito Autoral no Brasil: como funciona?

Dalmo: O direito autoral no Brasil vive um momento especial, numa oportunidade única de transformar-se e adaptar-se as novas tecnologias de comunicação. A Internet veio “pra” ficar, e ainda buscamos a melhor forma de remunerar os autores, que perderam muito com a pirataria e os downloads gratuitos. O sistema do direito autoral no Brasil se apoia em 12 sociedades arrecadadoras, onde os autores, produtores fonográficos, arranjadores e intérpretes são filiados, e o Ecad, que é o órgão que arrecada e distribui os direitos autorais em todo o território nacional. No momento, o Ecad vive um período conturbado com questionamentos por parte dos autores, que se sentem prejudicados na distribuição e nos critérios usados na arrecadação de shows, auditorias das planilhas de televisão, entre outros pontos.Os grupos críticos ao funcionamento do Ecad, criaram uma CPI na câmara para tentar melhorar e mudar os critérios ”pra”ticados hoje pelo órgão, que é vinculados a essas 12 sociedades de direitos autorais, mas apenas 6 compõe o colegiado de decisão do Ecad. Essa estrutura tende a se modificar, bem como o sistema de arrecadação e o formato de funcionamento da Lei antiga, a 9.610/98, que não está acompanhando as mudanças que a Internet propiciou desde o final dos anos 90. Há muito que se fazer, mas não podemos, de forma alguma, apagar tudo que se criou e se desenvolveu no direito autoral até agora. A maioria dos músicos não tem a menor informação sobre o funcionamento do direito autoral e como tirar partido dele em sua carreira. Não sabem, por exemplo, como se encaixam nas categorias de autor, intérprete ou produtor fonográfico, criando música áudio visual (trilhas) ou mesmo em cima do palco com seus shows. O músico brasileiro é desinformado por natureza.  

Poderia nos falar algo sobre a nova lei do Direito Autoral?

Dalmo: O Minc (Ministério da Cultura) anterior, com o Ministro Juca Ferreira, apresentou uma reforma da Lei do Direito Autoral e a colocou em aberto para consultas, sugestões e debates, com a intenção de reformulação em vários itens da antiga lei. Com a troca de ministros, assumiu no gov. Dilma, a ministra Ana de Holanda, houve críticas a nova proposta e um novo debate foi aberto. No momento, Ana de Holanda, apresentou sua proposta de mudança de Lei, contendo muitos itens semelhantes a proposta anterior. Os pontos em desacordo são basicamente a questão de se ter ou não um órgão fiscalizador ao trabalho do Ecad, ela não previu isso, e as questões que envolvem a Internet. 

Existem muitos veículos de comunicação que não pagam os direitos
autorais?

Dalmo: Sim, existem quase 40% das rádios no Brasil que não pagam direitos autorais, apesar de enviar planilhas do que foi executado. Algumas estão sendo processadas pelo Ecad por não pagarem nada, outras fazem acordo e recebem algum beneficio, um desconto de 10% por estarem em dia com o pagamento. (Sobre) As TVs fechadas: sabemos que alguns canais não pagam e também estão
sendo acionadas pelo Ecad. 

Muitos músicos evangélicos não sabem o que é Direito Conexo. Poderia explicar o que é e como funciona?

Dalmo: Funciona assim: o Ecad arrecada o direito autoral geral, em todo território nacional, e este grande volume de dinheiro (no ano passado arrecadou 511 milhões), chega ao órgão e é fracionado. Dois terços vão para a caixa de autorais (autores e editoras) e um terço vão para o direito conexo. O conexo engloba as categorias de músico acompanhante, incluindo-se arranjadores, produtores fonográficos e intérpretes. Os percentuais distribuídos são os seguintes:
Da arrecadação total, o Ecad fica com 17,4% (custos administrativos do órgão) e as Sociedades ou Associações de direitos autorais (Amar, Abramus, UBC, Socimpro e outras) fica com 7,6% para seus custos administrativos. O que sobra, 75%, vira 100% e é distribuido na razão: 66,66% (2/3) vai para o autoral. Os 33,33% (1/3) restantes vão para o conexo. Os interpretes recebem se estiverem dentro de uma amostragem de 450 obras mais executadas no trimestre, mas isso vai mudar com novas tecnologias que permitirão pagar todas as músicas que tocam em radio ou tv.
Resumindo os conexos: 41,7% vão para Intérpretes; 41,7% para produtores fonográficos e 16% restantes vão para músicos acompanhantes.


Você também é produtor de jingle. Como funciona?

Dalmo: O mercado de jingle é mais forte em São Paulo, onde estão concentradas as grandes agências de publicidade que opera em grande escala para as empresas no Brasil todo. Mas, existe o mercado regional e no Rio temos algumas produtoras de jingles que trabalham como prestadoras de serviço das agencias. É um mercado muito volátil, não há uma regulagem padronizada, tudo é muito em função do serviço que se executa.
Meu trabalho é basicamente criar jingles de toda espécie, sejam comerciais ou políticos, letra e música, e você tem que passar uma mensagem rápida, que pegue no ouvido do cliente e traga todo o conteúdo da venda ou marketing do produto. É complicado ter que apresentar um produto, em música, em 30 segs ou 1 minuto, de maneira eficiente e aquilo represente uma maior divulgação e traga um retorno ao cliente. Mas, em publicidade, pode-se tudo, vale qualquer ideia criadora que possa trazer o cliente “pra” perto do produto. Em política eu acho mais fácil, porque é mais prático passar o slogan, o número de votação e as propostas dos candidatos, em tempo maior que 1 minuto em alguns casos. Mesmo em 30 segs. é mais fácil passar para os eleitores o projeto do candidato.
Em jingle, não se paga direito autoral, o preço é acordado entre as partes, criadores e produtores, cantores, arranjadores, baseados em uma tabela que depende do que se paga para a equipe de produção. Um vocalista pode receber algo entre 250 e 500 reais, ou mais um pouco, e um vocalista solista pode ganhar algo entre 600 e mil reais, dependendo do que se tem “pra” gastar no trabalho. Há todo um trabalho de pós-produção, edição, mixagens, como acontece com a música convencional. Uma criação pode variar entre 800 reais até 2 mil reais, dependendo da produção.

O que você acha dessa grande visibilidade da música gospel no Brasil? 

Dalmo: A música gospel é o mercado de maior crescimento nos últimos anos. Por isso mesmo, atrai “pra” si, uma gama de compositores, cantores e produtores que vieram do mercado convencional. Neste mercado temos outros atrativos, tais como, pouca pirataria e uma distribuição bem equilibrada no território nacional. Gravadoras como a Line Rlecords, que inicialmente abraçou a causa e se constituiu na maior gravadora Gospel, já sofre a concorrência de outras que buscam o mesmo objetivo onde se misturam fé e comercio. É um mercado que concorre já em condições iguais ao mercado convencional. Artistas se apresentam em festivais evangélicos e também em canais de tv que detém chancela de pastores ou não.

Qual sua opinião a respeito do uso das redes sociais para os músicos divulgarem seu trabalho?

Dalmo: As redes sociais se constituem num divisor de águas fortíssimo na divulgação musical de forma geral. Tanto o twitter, o myspace, hotsites, blogs e o poderoso facebook, são hoje o que há de melhor para quem não tem recurso para promover seu trabalho e pretende atingir rapidamente um grande número de pessoas. Porém, como tudo que é bom atrai uma gama enorme de interessados, a Internet se tornou um foco de atração de coisas boas e muito ruins também. O filtro disso tudo é o seu dedo, o seu click no mouse, fica com você a opção de ver ou não ver, ouvir ou não ouvir. Tem muita coisa ruim na web e a filtragem é difícil, pois ao mesmo tempo você joga pro mundo o fruto do seu trabalho que está concorrendo em iguais condições com um trabalho medíocre..., e o pior que muitas vezes o medíocre vence, pois vivemos uma cultura de inversão de valores, fruto da falta de educação e poder crítico do nosso povo brasileiro, que prefere escolher aquilo que é totalmente popularesco sem nada “pra” trazer de novo, aquilo que realmente faz a diferença, foi estudado, embasado culturalmente falando. Portanto, pode ser uma faca de dois gumes.

O mercado fonográfico sofreu grandes alterações nas últimas décadas, com o uso da internet. Como você enxerga essas alterações? São positivas ou negativas? Quem seriam os maiores beneficiários e os mais prejudicados nesse processo?

Dalmo: Todo artista hoje tem que estar linkado com as tecnologias internéticas, sob pena de ficar a margem dos acontecimentos, tanto na produção de sua música quanto na divulgação de seu trabalho. Acredito muito que começamos a ver uma seleção natural de estilos, cada segmento terá seu espaço dentro do grande mercado mundial, globalizado, que temos hoje. O maior problema a ser resolvido é a questão dos direitos autorais na rede, se não houver mecanismos para proteção das obras que caem na rede, o autor estará fadado a falência e desistência deste mercado, pois ninguém vai criar “pra” não receber nada em troca, é lei da oferta e da procura. Cabe aos pensadores do direito autoral, a nova lei, uma premiação a estes aspectos do direito autoral na rede. A tecnologia pode caminhar lado a lado com o mercado artístico no sentido de separar e proteger este mercado. Eu diria que os beneficiários e/ou prejudicados, são os mesmos atores que desempenham os papéis neste mercado. Produtores de música não terão espaço num mercado que se resume a shows e deixa todo o outro lado (execução pública e vendagem de música) desguarnecido. Exemplos como iTunes e os sites que vendem música pela internet, alguns dentro de gravadoras tradicionais, já começam a dar bons sinais de sua graça, com números cada vez mais expressivos, vide o mercado de música em celulares, como os ringtones pagos pelas operadoras de telefones móveis e jogos eletrônicos.

Com a internet, muitas pessoas têm a chance de ficar famosas, exibindo seu "talento" pela rede. Você acha isso positivo?

Dalmo: Este é outro tema bastante discutível, pois a Internet pode facilmente transformar um "embuste artístico" numa "Ferrari, ou vice-versa, há que se ter muito cuidado. O exemplo mais próximo que podemos analisar é o vídeo da família cantando a música "Pela nossa alegria", que deve ser olhado sob o prisma da (...) brincadeira (...), e não para transformá-los em pop star da noite pro dia. Mas, é exatamente isso que a Internet pode produzir, gato por lebre. Mas, é claro que o contrário também pode acontecer, ou seja, um grande e novo artista ter seu trabalho apresentado nas redes e se tornar um ícone, sem dúvida. Eu diria que o saldo é mais positivo que negativo, porque antes este poder estava nas mãos das grandes gravadoras, que faziam o que queriam em termos de produções musicais. Hoje este poder está diluído nas mãos de quem quiser apostar, é mais democrático, esta socializada a cultura de massa.

Deixe um recado para a galera que trabalha na área musical:

Dalmo: Eu sou otimista sempre e grande entusiasta quando falamos de música brasileira de qualidade. Temos a melhor música do mundo, a mais diversificada, a mais rica em ritmos e levadas, aquela que mais coloca ingredientes novos no liquidificador musical. Aconselho aos músicos que não sejam apenas músicos, pois hoje o mercado é seletivo e muito competitivo. O músico tem que tocar, criar, se auto produzir, ser seu próprio produtor, gerenciador de negócios, administrador e técnico. A informática veio para ficar e trazer conhecimentos que facilitaram em muito a vida de quem produz.
Obrigado pela oportunidade que o meu ex-aluno e amigo Leandro me proporcionou: falar daquilo que mais gosto.

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